Greve SAMS

Os Médicos do SAMS do Sindicato dos Bancários Sul e Ilhas (SBSI) estão hoje em greve porque exigem retoma processo negocial após a denúncia do Acordo Colectivo Trabalho pelo Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas ao mesmo tempo que se assiste ao desmantelamento do corpo clínico e substituição por ainda mais prestadores de serviço.

Os 92% de adesão não deixam dúvidas, nem relativamente à justiça das reivindicações, nem ao ambiente actual de degradação, nem às perspectivas sombrias para o futuro.

Um serviço que se pretenderia de excelência e com acompanhamento ao longo da vida dos associados do SBSI e familiares não se compadece com mudanças de nomes e caras a todo o momento. Na Medicina a confiança nas equipas tem valor inestimável!

E se, em relação a 2015, havia em 2017 menos 9% de Médicos não é de estranhar que comparando os mesmos anos em 2017 tenha havido menos dias de internamento, menos cirurgias e menos consultas no SAMS e infelizmente com a degradação financeira.

Afirmar que os Sindicatos Médicos, que assinaram 36 acordos coletivos com governos da República e das Regiões Autónomas de diferentes cores partidárias, com Parcerias Público Privadas, do Grupo Melo, Lusíadas Saúde e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa vivem no passado apenas pretende esconder a incapacidade da gestão do SAMS em melhorar a qualidade dos cuidados de saúde prestados aos seus associados.

O próprio SBSI dizia no seu orçamento de 2018 “O SBSI apresentou propostas em linha com a prática do setor tendo como base acordos já em vigor e subscritos por esses sindicatos” mas durante 3 anos, à genuína vontade negocial dos sindicatos médicos apenas contrapôs permanente intransigência, reiterada omissão, constante rudeza comportamental e desinformação, desperdiçando assim qualquer possibilidade de salvaguarda da paz social.

O SBSI fica incomodado com a luta dos Médicos em garantir a continuação da existência de um instrumento de regulamentação coletiva do trabalho e em bater-se pela defesa dos seus postos de trabalho nas clínicas e demais estabelecimentos e serviços, enquanto meio de valorização da qualidade técnica, continuidade e estabilidade do nível dos cuidados de saúde.

Sabemos que os associados do SBSI não ficam indiferentes ao saber que o seu Sindicato recusa reuniões com outras direções sindicais, ou negociação direta recorrendo a escritórios de advogados especializados em fusões e aquisições e a representar entidades patronais em vez de investir dinheiro na contratação de um corpo clínico estável.

Por fim os Sindicatos Médicos lamentam os incómodos que decorrem por esta greve, que se realiza para melhorar a qualidade e a estabilidade de um serviço de saúde que infelizmente tem vindo a perder fulgor, enquanto que as empresas de prestação de serviço médicos e o recurso a médicos reformados têm crescido exponencialmente.

Lisboa, 27 de novembro de 2018

Os Sindicatos Médicos - SMZS e SIM

No próximo mês de Maio faz 40 anos, os mesmos do SNS, que um grupo de médicos prestigiados se reuniu nas jornadas médico-sindicais, cuja principal decisão foi desencadear o processo que levou à constituição da primeira organização sindical médica, o Sindicato dos Médicos da Zona Sul.
Muitos desses nomes já tinham estado como membros dos mais activos no Movimento das Carreiras Médicas no final da década de 1950 e princípio da década de 1960.
jornada medico.sindical
 
Lei de Bases da Saúde

Artigo de Mário Jorge Neves, publicado originalmente no Jornal Tornado, no dia 27 de Dezembro de 2018.

Para iniciar a abordagem desta nova proposta de Lei, importa lembrar factos objectivos em torno desta importante e delicada matéria para a vida de todos nós.

Em 28/6/1979, a Assembleia da República aprovou o Projecto de Lei nº157/l sobre «as Bases do SNS» subscrito por António Arnaut, Mário Soares e Salgado Zenha.

Votaram a favor os deputados do PS, PCP, UDP e o deputado independente Brás Pinto e votaram contra os deputados do PSD, do CDS e os deputados independentes social-democratas.

A aprovação deste projecto veio dar origem à Lei nº 56/79 publicada em 15 de Setembro de 1979.

Ainda o SNS dava os seus primeiros passos na estruturação e operacionalização dos serviços e logo em 1982 um governo presidido por Pinto de Balsemão desencadeou a primeira tentativa para a sua destruição, através do DL N.º 254/82.

Com o pretexto de transformar as administrações distritais de saúde em administrações regionais de saúde, esse decreto-lei revogou 46 artigos da Lei de Bases do SNS.

Em 1984, o Tribunal Constitucional, através do Acórdão nº 39/84, declarou inconstitucional o DL N.º 254/82.

Em 1990, o governo presidido por Cavaco Silva elaborou e publicou a Lei n.º 48/90 (de 24 Agosto).

Nessa lei eram estabelecidas diversas disposições que importa lembrar:

«É apoiado o desenvolvimento do sector privado da saúde e, em particular,as iniciativas das instituições particulares de solidariedade social, em concorrência com o sector público.»
«Nos termos a estabelecer em lei, pode ser autorizada a entrega, através de contratos de gestão, de hospitais ou centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde a outras entidades ou, em regime de convenção, a grupos de médicos.»
«O Estado apoia o desenvolvimento do sector privado de prestação de cuidados de saúde, em função das vantagens sociais decorrentes das iniciativas em causa e em concorrência com o sector público.»
«O apoio pode traduzir-se, nomeadamente, na facilitação da mobilidade do pessoal do Serviço Nacional de Saúde que deseje trabalhar no sector privado, na criação de incentivos à criação de unidades privadas e na reserva de quotas de leitos de internamento em cada região de saúde.»
«A lei fixa incentivos ao estabelecimento de seguros de saúde.»

A leitura destas disposições mostra à evidência que o seu objectivo era definhar e destruir o SNS.

Como é possível admitir que o dinheiro dos contribuintes, do pagamento dos nossos impostos, seja utilizado para apoiar o desenvolvimento do sector privado da saúde, ainda para mais em concorrência com o sector público, bem como a atribuição de incentivos para os seguros de saúde?

Então, onde estão as tão apregoadas leis miraculosas do mercado e da livre iniciativa?

Utilizou-se, ao longo dos anos, dinheiro dos contribuintes para grupos económicos, que depois até vão pagar os seus impostos comerciais no estrangeiro.

No nosso país, nunca se verificou qualquer limitação ou obstaculização à criação de unidades privadas de saúde. Uma vez constituídas, devem sujeitar-se às leis do mercado e da concorrência e não virem exigir o seu financiamento com dinheiros públicos, financiamento esse que depois falta nos serviços públicos de saúde e na sua capacidade de resposta.

Isto já não constitui matéria de discussão política, mas uma questão de decência republicana!

Mas apesar de todas as malfeitorias que tem sofrido e da continuada parasitação dos seus dinheiros, o SNS é o único serviço público que coloca o nosso país nos primeiros lugares mundiais de desempenho. Em poucos anos, o SNS mudou completamente o panorama assistencial e sanitário do nosso país.

A título de exemplo, a taxa de mortalidade infantil, que é o mais importante indicador de saúde, era em 1970 de 58,6 por mil e no ano passado foi de 2,7 por mil. À nossa frente estão a Suécia e a Eslovénia com 2,5 por mil e a Finlândia com 2,3 por mil. No relatório mundial da OMS (Organização Mundial de Saúde) publicado em 2001, o nosso país encontrava-se em 12.º lugar com os melhores indicadores de desempenho.

Diversos relatórios da OCDE têm sublinhado as realizações do nosso SNS e a substancial melhoria dos indicadores de saúde e em 6 de Junho deste ano um jornal no nosso país publicou uma entrevista ao director-geral da OMS em que este afirmou “ Portugal tem um dos poucos bons sistemas de saúde do mundo”.

Nos últimos tempos temos assistido a afirmações públicas que apelam a “consensos” e a uma legislação “flexível” bem como ao aparecimento de novos slogans ideológicos de que não importa se a gestão é pública ou privada.

Os dois tipos de gestão têm objectivos distintos e não podem ser misturados:

A gestão pública tem como foco fundamental o bem comum da sociedade e a sua evolução civilizacional, a gestão privada está vocacionada para o lucro, o consumo e o negócio. A gestão pública existe para atingir uma missão que é considerada socialmente valiosa, a gestão privada existe para maximizar o património dos accionistas, tendo como critério de bom desempenho o resultado financeiro.

Neste contexto, a Proposta de Lei de Bases da Saúde do actual Governo vem introduzir importantes alterações em relação à citada lei de 1990.

Da sua leitura, considero importante referir os seguintes aspectos positivos:

1. Desaparece o princípio da concorrência entre o sector público e o privado e da criação de incentivos à constituição de unidades privadas

2. Assume que a gestão dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde é pública, podendo ser supletiva e temporariamente assegurada por contrato com entidades privadas ou do sector social.

Esta formulação limita consideravelmente a gestão dos serviços públicos por entidades privadas, uma vez que, a verificar-se, ela é supletiva.

3. Coloca a promoção da saúde e a prevenção da doença, como devendo ser consideradas na definição e execução de outras políticas públicas.

São estas medidas que podem tornar as pessoas mais saudáveis, com menor carga de doença, com menos multipatologias e menor recurso aos serviços.

4. Define a melhoria do estado de saúde da população, através de uma abordagem de saúde pública, da monitorização e vigilância epidemiológica e da implementação de planos de saúde nacionais, regionais e locais.

5. Estabelece a participação das pessoas, das comunidades e dos órgãos municipais na definição, no acompanhamento e na avaliação das políticas de saúde.

É na participação organizada da população que se procede ao ajustamento da política de saúde e à regulação externa dos serviços de saúde.

6. Considera que a política de saúde deve incentivar a adopção de medidas promotoras da responsabilidade social, individual e colectiva, nomeadamente apoiando voluntários, cuidadores informais e dadores benévolos.

7. Que o Estado promove a participação das pessoas na definição, acompanhamento e avaliação da política de saúde, promovendo a literacia para a saúde.

8. Que a intervenção das autarquias locais se manifesta, designadamente, no apoio aos sistemas locais de saúde, com especial incidência nos cuidados de proximidade e nos cuidados na comunidade, bem como no planeamento da rede de estabelecimentos prestadores e na participação nos órgãos de acompanhamento e de avaliação do sistema de saúde.

Os sistemas locais de saúde são as infraestruturas que estão em melhores condições para concretizarem a participação das pessoas, a promoção da saúde e a prevenção da doença, o desenvolvimento de planos locais de saúde, a cooperação dos actores locais e a melhor articulação entre os serviços prestadores de cuidados de saúde.

9. Que os sectores público, privado e social devem actuar de acordo com o princípio da cooperação, pautando-se por regras de transparência, prevenindo a indução artificial da procura, a selecção adversa de casuística e os conflitos de interesse nos profissionais.

A supressão do conceito de complementaridade entre os três sectores concretiza a autonomia funcional, organizacional e financeira entre eles.

10. Que o SNS dispõe de estatuto próprio, tem organização regionalizada e uma gestão descentralizada e participada.

11. Estabelece o princípio da Equidade, promovendo a correcção dos efeitos das desigualdades no acesso aos cuidados, dando particular atenção às necessidades dos grupos vulneráveis.

É uma medida particularmente importante para a diminuição das desigualdades em saúde.

12. Bem como o princípio da Proximidade, garantindo que todo o país dispõe de uma cobertura racional e eficiente de recursos em saúde.

13. Que a organização interna dos estabelecimentos e serviços do SNS deve basear-se em modelos que privilegiam a autonomia de gestão, os níveis intermédios de responsabilidade e o trabalho de equipa.

14. Que no seu funcionamento, o SNS se sustenta numa força de trabalho planeada e organizada de modo a satisfazer as necessidades assistenciais da população, em termos de disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade, numa evolução progressiva para a criação de mecanismos de dedicação plena ao exercício de funções públicas, estruturadas em carreiras.

A consagração do princípio da organização profissional em carreiras é de primordial importância no SNS. As carreiras profissionais hierarquizadas e assentes em concursos públicos de progressão e diferenciação técnico-científica têm sido um factor decisivo de garantia da qualidade do exercício profissional.

A qualidade formativa dos nossos profissionais de saúde é reconhecida internacionalmente, como é caso concreto da escola médica portuguesa que é considerada uma das melhores a nível mundial.

15. Que no seu funcionamento, o SNS se articula, em especial, com os demais sectores do Estado, com os órgãos municipais e das comunidades intermunicipais e com todas as entidades que operem na área da saúde.

16. A criação de bases específicas para a Saúde Mental e para a Saúde Ocupacional.

Por outro lado, existem matérias que impõe, na minha opinião, uma posterior reflexão e decisão:

A) A descentralização de competências nos órgãos municipais assume-se como um claro propósito político para o sector da saúde.

Esta formulação exige uma abordagem futura muito cuidadosa porque pode criar grandes conflitos no sector dado não haver qualquer experiência histórica desta modalidade de funcionamento, e enveredar pelo princípio de comando/controlo por entidades estranhas sobre as instituições de saúde.

B) A proposta refere que a lei pode prever a cobrança de taxas moderadoras,tendo em vista o controlo da procura desnecessária e a orientação da procura para respostas mais adequadas às necessidades assistenciais, sem prejuízo de poder determinar a isenção de pagamento, nomeadamente em função da situação de recursos, de doença ou de especial vulnerabilidade.

Não deveria ser efectuada a referência ao ”controlo da procura desnecessária”, uma vez que, em cada momento, quem decide a necessidade são sempre as pessoas.

C) É afirmado que os seguros de saúde são de adesão voluntária e de cobertura complementar ao SNS.

Esta formulação reconhece que a cobertura do SNS não é universal e geral, tornando-se contraditória com a definição constitucional do SNS.

D) Deveria ser criada uma base específica sobre Saúde e Envelhecimento.

E) A política de delimitação dos sectores prestadores de cuidados de saúde deve ser objecto de uma abordagem mais concisa, partindo desde logo do pressuposto de que tal delimitação não se limita a modalidades de regimes de trabalho dos profissionais de saúde, mas começa na utilização dos dinheiros públicos.

F) Estando presente na proposta governamental a focalização numa gestão pública mais qualificada, torna-se imperioso criar uma carta da gestão pública da saúde onde se definam os seus parâmetros gestionários específicos e os patamares de responsabilização dos membros das administrações aos vários níveis.

O SNS constitui um pilar fundamental do Estado Social, um factor de equidade incontornável para um desenvolvimento sustentável e um instrumento insubstituível para garantir a coesão social.

Sendo a coesão social entendida como a capacidade de uma sociedade para gerir a mudança e o conflito mediante uma estrutura democrática de distribuição dos seus recursos sócio-económicos, sócio-políticos e sócio-culturais, esta Proposta de Lei de Bases da Saúde assume uma importância muito acrescida porque extravasa para os vários domínios da sociedade.

Esta Proposta surge num momento particularmente sensível e não pode ser, de modo algum, desperdiçada. Nesse sentido, na posterior regulamentação importa desenvolver todos os esforços para que a defesa do SNS seja revitalizada com este novo enquadramento legal.

O poeta António Gedeão escreveu um dia num poema que:

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que o homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

O SNS tem sido o sonho que tem garantido a saúde e a vida a muitos dos nossos cidadãos sem discriminações de raças, de credos ou de condições sócio-económicas, permitindo que continuem a dar o seu contributo cívico para que o mundo pule e avance.

Dentro da melhor tradição humanista e solidária do nosso povo, importa preservar o direito à Saúde e não permitir que ele se transforme num privilégio de alguns ao dispor de accionistas.

Ao Dr António Arnaut, onde quer que ele esteja, um enorme abraço fraterno, na certeza de que esta obra humanista e de grande impacto no avanço civilizacional vai ter continuadores livres e honrados.

Manifestação

No dia 21.12.2018 os sindicatos médicos reuniram com a Ministra da Saúde e manifestaram a sua apreensão perante o crescente clima de insatisfação.

A FNAM expôs, como preocupações urgentes, a ausência de descongelamento da progressão na carreira, a insistência em manter um sistema de avaliação (SIADAP) inaplicável e a escandalosa inoperacionalidade dos sistemas informáticos, que põe em causa os cuidados médicos prestados aos doentes.

A Ministra da Saúde insiste que, na atual legislatura, não haverão aumentos salariais para nenhuma das carreiras na área da saúde.  

Mostrou disponibilidade para, num curto prazo, haver acordo quanto a:

  • Harmonização do regime de férias aplicável aos trabalhadores médicos, independentemente do vínculo contratual (CIT, CTFP); 
  • Esclarecimento, por Circular, sobre o devido pagamento do trabalho noturno no período entre as 7 às 8 horas da manhã, para os trabalhadores sindicalizados; 
  • Regulamentação dos concursos de mobilidade para os médicos hospitalares e de saúde pública;
  • Colocação a concurso das vagas ocupadas pelos médicos aposentados;
  • Redução do limite anual das horas extraordinárias em Serviço de Urgência (SU), das 200 para as 150 horas.

Informou ainda do trabalho em progresso relativo à atribuição do suplemento remuneratório aos médicos em funções de autoridade de saúde e extensão do regime de disponibilidade previsto a todos os médicos de Saúde Pública, a formulação das normas e disciplina do trabalho médico, o regime remuneratório inerente ao exercício de funções de direção e chefia, e a aplicação da progressão a todos os médicos, incluindo os que transitaram para o novo regime das 40h.

Foi discutida a necessidade premente de revisão do sistema de avaliação dos médicos. Para tal, foi constituído um grupo de trabalho que reunirá no próximo dia 10 de janeiro.

Ficam por responder problemas estruturais, como a negociação das carreiras médicas e grelhas salariais, bem como a passagem das 18 para as 12 horas em SU e reformulação da lista de utentes dos médicos de família.

A próxima reunião está agendada para o dia 23.01.2019.

A FNAM manterá a sua postura de defesa dos direitos dos médicos e encetará todas as formas de luta necessárias para preservar a dignidade da profissão.

© Sindicato dos Médicos da Zona Sul