Posição da FNAM sobre as versões finais dos projectos ministeriais de alteração à legislação das USF

Na sequência da última reunião de negociação no Ministério da Saúde relativa ao projecto de decreto-lei de alteração a várias disposições do diploma das USF e ao projecto de portaria da contratualização dos incentivos, foram remetidas às duas organizações sindicais médicas as respectivas versões finais.
Nesse sentido, importa sublinhar as seguintes questões essenciais:
1 – A FNAM, na apreciação que apresentou ao Ministério da Saúde, transmitiu a sua posição de princípio de que não admitia discutir qualquer nova formulação de regimes de trabalho para as USF, como era o caso da chamada “dedicação plena”, sem uma negociação global desta matéria para toda a Carreira Médica, bem como das correspondentes grelhas salariais.
Simultaneamente, deixou muito clara a sua posição de que não seria tolerada qualquer tentativa de, por via indirecta, subverter as disposições relativas às incompatibilidades consignadas nos Acordos Colectivos de Trabalho(ACT).
Nesta versão final, esses propósitos ministeriais foram abandonados.
2 – A perspectiva inicial do projecto de possibilitar, de forma expressa, que o cargo de coordenador de USF pudesse ser exercido por qualquer dos seus profissionais foi também abandonada ao ser confrontada com o conteúdo do nº 3 do artº 3º dos ACT, que muito claramente estipula que no âmbito das competências e do grau de diferenciação técnico-científica da profissão cabe-lhe a função de coordenar as equipas multiprofissionais.
3 – Outros aspectos igualmente reformulados nesta versão final foram, entre outros, a manutenção das actuais disposições sobre o horário base das 35 horas semanais e os limites de unidades ponderadas.
4 – Apesar da exaustiva fundamentação das propostas sindicais, o Ministério da Saúde não aceitou retirar, nomeadamente, as quotas de acesso ao modelo B, o que é desde logo um bloqueio ao mais adequado desenvolvimento da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, e não aceitou retirar a impossibilidade de um coordenador de uma USF desempenhar as funções de direcção do Internato, escamoteando que a actividade formativa é inerente ao percurso da Carreira Médica e colocando em risco todo o trabalho já desenvolvido nesta área. Não se entende a razão de tal medida uma vez que a nível hospitalar o director de internato pode ser um director de serviço.
Por outro lado, procedeu a uma modificação da redacção de uma das disposições que nada altera quanto aos resultados práticos que daí advirão.
Ou seja, até aqui as USF dispunham de autonomia para designar os seus coordenadores e apenas informavam posteriormente as instâncias hierarquicas superiores dos nomes em causa.
A penúltima versão do projecto ministerial referia num dos pontos que introduzia alterações “ Propor a nomeação de novo coordenador ao diretor executivo do ACES.”
Colocámos a questão na referida reunião que esta redacção conduziria à subordinação política das USF perante os nomeados pelos aparelhos político-partidários, dado que passariam a ser estes a determinar a nomeação dos coodenadores.
Na versão final agora recebida aparece a “curiosa” redacção de “Propor a nomeação de novo coordenador a qual é posteriormente comunicada ao diretor executivo do ACES para homologação”.
Se é uma proposta, a nomeação pode ser homologada ou não.
Este tipo de redacções tem conduzido sempre ao longo dos tempos a variadas interpretações para o benefício dos esquemas de controlo político das nomeações clientelares.
Esta redacção agora apresentada é inadmissível porque conduz rigorosamente ao mesmo resultado da anterior, o que significa que, intencionalmente ou não, aquilo que irá acontecer será a perda de autonomia funcional e gestionária das USF e o seu condicionamento e manipulação pelos nomeados por critérios político-partidários.
Ora, se o Ministério da Saúde quer, de facto, manter a autonomia gestionária das USF deveria ficar, eleger o coordenador, em vez de propor para ser homologado.
5 – Relativamente ao projecto de portaria da contratualização dos incentivos avaliamos, já, de forma positiva as alterações realizadas, para as quais foi dado um forte e empenhado contributo da FNAM.
No essencial, o novo processo de contratualização passará a ser mais centrado no cidadão e nas populações, mais focado em resultados de saúde e mais orientado pela melhoria contínua dos processos de cuidados.
A FNAM defende como condição essencial a acessibilidade aos cuidados de saúde primários e vê, no entanto, com preocupação a manutenção como um critério para extinção de USF, o incumprimento dos "Tempos Máximos de Resposta Garantidos", sem que esteja claro como vai ser realizada a respectiva medição.
O ano de 2017 será, em princípio, um ano de transição, atendendo ao enorme atraso na definição concreta e na operacionalização da nova metodologia de contratualização. A FNAM continuará a intervir por todos os meios e em particular através do Grupo Técnico para que a nova concepção corresponda e promova boas práticas clínicas e de saúde, bem como a melhoria contínua da qualidade e dos resultados em saúde.
6 – Assim, a FNAM considera muito preocupante algumas alterações que surgem no citado projecto de decreto-lei, alertando desde já para as consequências que daí irão advir para o curso da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários e espera que o Ministério da Saúde ainda possa ter o bom senso de as corrigir antes da sua publicação.
Lisboa, 10/2/2017
A Comissão Executiva da FNAM
© Sindicato dos Médicos da Zona Sul