A Comissão de Saúde da Assembleia da República discutiu, no passado dia 23 de Maio, as apreciações parlamentares do BE e do PCP ao novo regime jurídico do internato médico, que estabelece uma série de alterações, nomeadamente o pagamento de 90 euros pela prova de acesso à especialização.

Todas as propostas, quer do BE quer do PCP, que propunham um contínuo entre todo o processo do internato médico, desde a entrada até ao fim da especialidade (tal com a FNAM sempre tem defendido) e que poderiam diminuir a indiferenciação e a precariedade, foram rejeitadas, com os votos contra do PS e as abstenções do PSD e do CDS.

Este regime agora aprovado põe em causa um dos pilares essenciais do Serviço Nacional de Saúde: a especialização médica.

O PCP apresentou também uma proposta que obrigaria à abertura de concursos no prazo máximo de 30 dias após a homologação da lista classificativa final do internato médico (rejeitada com os votos contra do PS e a abstenção do PSD) e outra proposta sobre a definição do horário normal de trabalho em 35 horas semanais, que teve o mesmo resultado, mantendo-se, portanto, a proposta do Governo que fixa o horário em 40 horas semanais.

Desta maneira, o Governo continua a agravar as condições de trabalho dos médicos, particularmente dos mais jovens, pondo em causa a qualidade da formação médica e dos cuidados de saúde, bem como a própria sustentabilidade do SNS, ao não garantir que os nossos utentes são tratados e acompanhados por médicos especialistas.

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Na terça-feira, 29 de Maio, tomaram posse os novos membros dos corpos gerentes do Sindicato dos Médicos da Zona Sul.
 
Estiveram também presentes o Bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, o Secretário-Geral do Sindicato Independente dos Médicos, Jorge Roque da Cunha, o Secretário-Geral da CGTP-IN, Arménio Carlos, o Presidente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, José Carlos Martins, e o primeiro presidente do SMZS, Dr. Sá Marques.

No início desta legislatura o governo anunciou como um dos seus objetivos a atribuição de um Médico de Família a todos os portugueses. Têm vindo igualmente a anunciar, ao longo do mandato, que há mais de tudo no SNS: mais profissionais de saúde, mais consultas hospitalares, mais intervenções cirúrgicas e inclusivamente mais utentes com Médico de Família.

Importa, contudo, esclarecer em que condições estes números têm sido atingidos, em particular no que à atribuição de Médicos de Família diz respeito.

Este governo tem promovido a transparência de muita da atividade do SNS, disponibilizando hoje um conjunto de dados relativos à saúde em Portugal, nomeadamente através da plataforma denominada BI da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários onde se encontra toda a informação relativa a este nível de cuidados.

Na referida plataforma, cuja última actualização é de 30/04/2018, no que ao Alentejo Litoral diz respeito, importa não só conhecer os dados publicados, mas também a realidade concreta desses dados, a bem da transparência.

No ACES Alentejo Litoral estão inscritos 93.842 utentes, dos quais 6.816 não têm Médico de Família atribuído, correspondendo a 7,2% dos utentes inscritos. Contudo, quando exploramos estes números, especificamente por unidade funcional, verifica-se que a maioria dos utentes que terão Médico de Família atribuído, têm na verdade atribuído um médico indiferenciado, não se tratando de um médico de Medicina Geral e Familiar.

UCSP

N.º total utentes

Suposto n.º de utentes sem médico de família (segundo dados do BI da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários)

N.º real de utentes sem médico de família

(contabilizando utentes em listas de médicos indiferenciados)

Alcácer do Sal

12.123

0

cerca de 7.000 (50%)

Grândola

14.322

641

cerca de 7.500 (52%)

Odemira

25.478

2.794

cerca de 14.000 (66%)

Santiago do Cacém

27.335

102

cerca de 10.800 (40%)

Sines

14.584

3.279

cerca de 9.900 (68%)

Total ACES Alentejo Litoral

93.842

6.816

cerca de 52.000 (55%)

Reproduzimos a última intervenção pública de António Arnaut, no dia 18 de Maio, para o Congresso da Fundação Saúde SNS:

Senhor Presidente do Congresso, 

Senhores congressistas e convidados 

Não podendo estar convosco, felicito a organização e todos os participantes por esta jornada em defesa do Serviço Nacional de Saúde. 

Como todos sabemos, os meus amigos como profissionais e eu como utente, o nosso SNS atravessa um tempo de grandes dificuldades que, se não forem atalhadas rapidamente podem levar ao seu colapso. E tudo em consequência de anos sucessivos de subfinanciamento e de uma política privatizadora e predadora resultante da Lei 48/90, ainda em vigor, que substituiu a lei fundadora de 1979. A destruição das carreiras depois de tantos anos de luta, iniciada em 1961, foi o rombo mais profundo causado ao SNS. 

Sem carreiras, que pressupõem a entrada por concurso, a formação permanente, a progressão por mérito e um vencimento adequado, que há muito defendo seja igual aos dos juízes, não há serviço Nacional de Saúde digno deste nome. A expansão do sector privado, verificada nos últimos anos, deveu-se a esta desestruturação e ao facto de a Lei 48/90 considerar o SNS como um qualquer sub-sistema, presente no “mercado” em livre concorrência com o sector mercantil. É a filosofia neoliberal que visou a destruição do Estado Social e reduziu o SNS a um serviço residual para os pobres. 

É preciso reconduzir o SNS à sua matriz constitucional e humanista. Há agora condições políticas e parlamentares para realizar essa tarefa patriótica e o governo propôs-se fazê-lo. A realização de iniciativas como este Congresso são uma forma legítima e democrática de chamar a atenção do governo para que cumpra o seu dever. Aliás, parece verificar-se um amplo consenso nacional sobre a indispensabilidade do SNS, como garante, em primeira linha, do direito fundamental à saúde. 

Faço votos para uma profícua discussão sobre esta temática e que, no final, resulte um contributo substantivo em defesa da consolidação do SNS, para que nos 40 anos desta grande reforma possamos todos voltar a ter orgulho no nosso SNS. 

Vosso 

António Arnaut 

Coimbra, 18 de Maio de 2018

© Sindicato dos Médicos da Zona Sul